"Alta Ansiedade" - Este tempo, que se parece com todos os tempos

Esta semana, o blogue Synapsis convida-os: a ler “Alta Ansiedade”, uma crónica deste tempo, que se parece com uma história de todos os tempos, presentes e passados, e nos faz pensar que é o guião de todas as histórias que se irão contando no futuro; a assistir ao Sarau Poético com José Fanha, integrado no Programa Cultural "Bocage o Poeta da Liberdade". E dá-lhes conta do avanço das filmagens de “Itinerário, o meu caminho até Sebastião da Gama”, um filme de Alberto Pereira. Na capa desta semana, “Inverno”, uma fotografia de José Alex Gandum.


ALTA ANSIEDADE



Apreensivo com as alterações climáticas, com a balbúrdia de género, com as fake news, com o movimento #Me Too, com a Covid 19 e com mais um ror de coisas que lhe são gritadas diariamente por fanáticos nas redes sociais, nos jornais, na televisão e na rádio, Samuel enfermou, acometido de angústia, pesadelos, taquicardia, tremores incontrolados e suores frios.

Foi ao médico, que o aconselhou a descontrair-se, viajar, ingerir comida saudável e fazer caminhadas, mas ele não acreditou nas mezinhas do clínico e começou a tomar calmantes e antidepressivos.

Mas as drogas não estavam a resultar e, a sobrevoar as já referidas maleitas, uma tormentosa maré negra de inquietantes presságios começara, agora, a assolar os seus tristonhos dias com a emergência de uma traiçoeira pandemia. Samuel achava que o seu jovem e musculado corpo de 35 anos não iria aguentar por muito tempo o seu velho e decrépito espírito de 150 anos, esculpido na insuportável desarmonia da pós-modernidade.

Certo dia, desesperançado, travou, por puro acaso, conhecimento com um sábio chamado Vespúcio Viana, de momento, mercê das contingências da vida, a viver na condição de sem abrigo, num recanto esconso junto à Muralha Medieval de Setúbal. Meteram conversa. Vespúcio Viana, enroscado em duas boas mantas, assentes em três ou quatro camadas de papelão, ouviu placidamente as queixas de Samuel. Quando aquele terminou a sua longa lista de queixas, Vespúcio cofiou a longa barba e replicou:

“Eu, há muito, que já estou para lá de toda essa trapalhada que o aflige a si e à humanidade. Escolhi vir morar para debaixo da abóbada celeste já lá vai uma mão cheia de anos. Aqui, em dias maus, sofre-se a canícula veranil ou a humidade da invernia, nada que as gentes de antanho não tenham já sentido na pele, muito antes da psicose das alterações climáticas, que desnorteia, com ou sem razão, os contemporâneos. Mas, em dias bons, vive-se a experiência extraordinária da absoluta liberdade. O que aí vem, a despeito da multidão de doutos adivinhos que malham prognósticos na cachimónia dos incautos, ninguém sabe. Mas o que vier virá, graças a Deus, por sua obra e graça, Ele que tudo sabe, tudo vê, tudo controla e tudo cria. As fake news aqui não se governam. Neste lugar onde me vê, não há diferença entre notícias falsas e verdadeiras. A realidade, seja lá isso o que isso for, vive, agora, entalada entre o papelão e os cobertores que me protegem do chão duro e frio. Quanto à ideologia de género e esses movimentos que fazem da gritaria, do caos e do escândalo o seu modo de vida, endosso o assunto ao Criador. Ele, que tudo cria, tudo vê, tudo controla e tudo sabe há-de, se, por acaso, encontrar nas coisas criadas algum defeito de concepção, providenciar as necessárias afinações e devolver ao mundo a paz, a harmonia e o sossego que ele não conhece desde o início dos tempos”.

Salvador Peres


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Sarau Poético com José Fanha


22 de Janeiro, 18h00

Auditório Bocage.

Evento integrado no Programa Cultural "Bocage o Poeta da Liberdade".

Auditório Bocage, Av. Nuno Álvares, 2910-269 Setúbal

https://www.google.com/maps/place/Audit%C3%B3rio+Bocage+Junta+de+Freguesia+de+S%C3%A3o+Sebasti%C3%A3o/@38.5320491,-8.8761673,17z/data=!3m1!4b1!4m5!3m4!1s0xd194361bef0c24d:0x15964fe0bdf6d27b!8m2!3d38.5320449!4d-8.8739786


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    Filmagens de “Itinerário” na Fortaleza da Arrábida


As filmagens de “Itinerário, o meu caminho até Sebastião da Gama”, um filme de Alberto Pereira, decorreram, no passado Sábado, na Fortaleza de Santa Maria da Arrábida.

O desenvolvimento do filme, uma ideia original de Alberto Pereira, assenta num puro acaso: a descoberta, por um desconhecido, de um livro de Sebastião da Gama, perdido num banco de jardim. A pessoa que encontra o livro nunca ouviu falar de Sebastião da Gama, mas fica curioso e inicia um caminho de descoberta do Poeta e da sua obra. Ao longo do filme, essa pessoa vai narrando a forma como chegou ao conhecimento do Poeta.

“Itinerário” é o título de um dos poemas de Sebastião da Gama e é, também, de alguma forma, o roteiro que o protagonista tem de fazer para chegar ao conhecimento do Poeta.

João completo protagoniza a personagem que parte em busca de Sebastião da Gama.

O guião e a banda sonora do filme são da autoria de Salvador Peres.




Sebastião Artur Cardoso da Gama nasceu em Vila Nogueira de Azeitão a 10 de Abril de 1924 e morreu em Lisboa a 7 de Fevereiro de 1952, com 27 anos de idade, vítima de tuberculose óssea e de meningite renal.

A sua vida foi breve, mas preenchida. Leu, viajou, leccionou e deixou uma obra de grande importância no contexto da poesia moderna portuguesa. Os primeiros três livros publicados foram de poesia: Serra-Mãe (1945), Cabo da Boa Esperança (1947) e Campo Aberto (1951). Postumamente, foram publicadas as obras Pelo sonho é que vamos (1953), Diário (1958), Itinerário paralelo (1967) e O segredo é amar (1969).

Texto e fotos de SP

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