Um cenário pós-apocalíptico

 


Logo a seguir ao cais de embarque dos ferries, nas Fontaínhas, Setúbal, até aos estaleiros da Lisnave (antiga Setenave), numa extensão de mais de treze quilómetros, a margem direita do Sado é uma paisagem caótica, um mosaico de imagens feéricas saídas de um filme pós-apocalíptico. Está à vista de todos. Basta sair da Doca das Fontaínhas, em direcção a leste, pela estrada da Mitrena, e as imagens que nos passam pelos olhos falam por si. Poluição dos solos e da água, sucata por todo o lado, fábricas lançando no ar e na água essências suspeitas e putrefactas, embarcações afogadas numa morte de ferrugem, apodrecendo num areal esverdeado.

Aqui ninguém é contra o desenvolvimento industrial! Tão-pouco contra a utilização de infraestruturas que ajudem à economia e à produção de riqueza. Mas isso não justifica o crime que ali está a ser perpetrado há décadas. Nem redime aqueles que vendem progresso à custa de um dos mais valiosos recursos naturais do país, o Estuário do Sado.

O que ali se vê é imperdoável e deveria envergonhar-nos a todos. É o exemplo vivo de ganância, falta de visão, desrespeito pelo ambiente e incapacidade de gerir com prudência, bom senso e inteligência os recursos que a natureza generosamente nos doou. 

 

Salvador Peres


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Viver para sempre

O advento dos relógios electrónicos, dos telemóveis e outras geringonças horárias com mostradores que deixam cair as horas minuto a minuto, trouxe à percepção da vida uma diferente perspectiva do tempo que passa. A cronologia transfigurou-se num saltitar regulado pela ligação da maquineta a um mecanismo oculto, sem rodas dentadas, rodízios, molas ou pêndulos, que só dá as horas em intervalos de minuto. Raramente alguém acompanha a passagem de um minuto a outro, a não ser que se disponha a ficar, até sessenta segundos, a fixar o relógio até que, tic!: a um minuto sucede outro minuto.

Em não fixando o mostrador da caranguejola horária, o consumidor de tempo nem dá pela passagem do dito. O tempo passa a ser uma coisa imaterial e subjectiva. Mas não é mesmo isso que o tempo é, em querendo nós que se assuma como coisa? Talvez, e, se sim, vem mesmo a talhe de foice para o que descrevo a seguir.

Veio-me ao pensamento esta reflexão ociosa, quando, pelo meio da tarde, olhei para as horas e verifiquei, não sem algum alvoroço, que o meu relógio tem ponteiro dos segundos. O espanto resulta do gesto automático a que nos habituámos, que é ver as horas sempre que consultamos alguma coisa no telemóvel. E raramente olhamos para o relógio de pulso, aqueles que ainda o usam, como é o meu caso.

Diz um estudo que li por aí que tiramos o telemóvel do bolso umas 200 vezes por dia. São 200 vezes que o mostrador horário incorporado nos mostra as horas. Duzentas vezes que constatamos a aparente imobilidade do tempo, porque, no golpe de vista ao mostrador do telemóvel só vemos um número fixo, diferente de cada vez que olhamos, é certo, mas fixo, sempre fixo, como se o tempo estivesse suspenso naqueles dígitos.

Quando, pelo meio da tarde, consultei as horas no meu relógio, e acompanhei o ponteiro no seu incessante e infinito rodopio pelo mostrador, engolindo um a um infinitos minutos, dei por mim a contar cada segundo. E o tempo assumiu, subitamente, um significado material e objectivo.

Não sei como resolver esta aparente contradição entre as horas que vejo no telemóvel e as que vislumbro no meu relógio de pulso. Tão-pouco sei qual a essência do tempo, de onde veio, se existe ou não, ou se foi apenas inventado para medirmos a finitude das coisas. Uma coisa, porém, me parece sensata: se querem viver para sempre, suspensos no tempo, nunca usem um relógio com ponteiro dos segundos.

 

Salvador Peres


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A Poesia é uma Arma Carregada de Futuro

No âmbito da Comemoração do Dia Mundial da Poesia (Dia 21 de Março), uma das sessões do programa, para a XIII Maratona da Poesia de Setúbal - “Liberdade Poética. A Poesia de Abril”, integrada nas Comemorações dos 50 anos do 25 de abril, é a poesia de Pedro Lamares:

A Poesia é uma Arma Carregada de Futuro - Pedro Lamares, a solo.

Gabriel Celaya dá o mote a um recital que vem de Gil Vicente e Camões aos autores contemporâneos, com os olhos bem fincados no nosso tempo, em busca de futuro. Fala-se de amor e morte (os grandes temas universais da poesia), mas também do medo, de discriminações várias (raciais, sexuais ou religiosas) e de esperança. Com algum humor e uma lógica de conversa, abre-se um espaço de diálogo com o público.

“Assim é a minha poesia: poesia-ferramenta e ao mesmo tempo pulsação do unânime e cego. Assim é, arma carregada de futuro expansivo com que aponto ao peito”.

Gabriel Celaya

Duração: 90 min

Indicado para M/16 anos

21 Março, pelas 18h30 no Auditório da Biblioteca Municipal de Setúbal


SP


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Setúbal e Arrábida com presenças muito fracas na BTL

A Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL) bateu recordes de visitantes este ano. O certame terminou no dia 3 de Março e excedeu as expectativas em todos os aspectos, como animação e número de visitantes profissionais e público em geral. O facto era previsível, já que o Turismo é neste momento o principal impulsionador económico em Portugal.

Mas apesar das previsibilidades e da força que o Turismo está a ter em muitas economias municipais e regionais, a Península de Setúbal esteve fracamente representada no principal certame turístico em Portugal. A cidade de Setúbal esteve mesmo confinada a um pequeno espaço a um canto do Pavilhão 1 da FIL repartido com Palmela e Sesimbra sob o signo da Arrábida. É claro que ninguém quer uma grande pressão turística na Serra da Arrábida, por motivos ambientais, mas toda a envolvente do Parque Natural da Arrábida tem potencialidades turísticas enormes pelo que a região merecia um maior destaque num evento de tão grande importância e projeção. Parece que foi um erro incluir a Região de Turismo da Costa Azul na Região de Turismo de Lisboa, pois Setúbal e toda a sua envolvente têm características que a diferenciam em muito das zonas de Lisboa e a norte da capital. 


Quanto à BTL, destaque para regiões que souberam tirar partido do melhor que têm para oferecer, e por isso foram as regiões mais visitadas, como o Alentejo, os Açores, a Madeira ou o Algarve, todas com presença muito relevantes na BTL de 2024.

 

José Alex Gandum

 

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Tempo de homenagens às Mulheres de Abril e a Ary dos Santos

A semana passada trouxe eventos de homenagem às Mulheres de Abril e ao poeta José Carlos Ary dos Santos. O espetáculo "A Mulher é uma Arma", no passado dia 28 de fevereiro, no Tivoli, em Lisboa, celebrou as conquistas da mulher com a Revolução dos Cravos, tendo contado com a participação de Ana Bacalhau, Kátia Guerreiro, Luanda Cozetti, Patrícia Antunes, Patrícia Silveira, Rita Redshoes, Sofia Escobar e Viviane, numa produção de Renato Júnior.



No dia 2 de Março foi a vez dos Irmãos Feist, acompanhados pela Banda Filarmónica da Arrentela, homenagearem o poeta Ary dos Santos (assinalando os 40 anos da sua morte), com um concerto no Pavilhão Municipal da Torre da Marinha, no Seixal, que reuniu milhares de pessoas. Com Nuno Feist ao piano, Henrique Feist interpretou inúmeros temas escritos por Ary e cantados por artistas como Fernando Tordo, Simone de Oliveira, Carlos do Carmo, Tonicha ou Hugo Maia de Loureiro (recentemente falecido), entre outros.

 

José Alex Gandum

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FICHA TÉCNICA

 Coordenação Editorial de Salvador Peres e José Alex Gandum

 Textos José Alex Gandum e Salvador Peres

Imagens de José Alex Gandum e Salvador Peres

Edição de Salvador Peres

 


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