No caminho de areia que o mar esculpiu

 


Por uma estrada verdejante e sinuosa, que sai de Setúbal num percurso desenhado na vizinhança do rio, segue-se em direcção ao maciço da Arrábida. Logo depois de se transpor a Comenda e depois de se subir a ligeira encosta acima da Fortaleza do Outão, deparamos com o quadro espantoso do areal da Praia da Figueirinha, que se espraia na encosta da Serra, num contraste dourado com as águas de um azul profundo do Atlântico.


A maré, na vazante, põe a descoberto uma extensa língua de areia que sai da Figueirinha e se estende, mar adentro, na direcção das praias de Galapos, Coelhos e Portinho. Está uma manhã de Primavera e vive-se o sossego da época pré-balnear. Na praia quase deserta, ouve-se o rumor da maré que vem esmorecer, numa plácida ondulação, no macio areal da praia.

Caminhando pelo istmo desenhado pela maré, costas voltadas para o mar, acolhe-nos a majestosa e imponente cordilheira da Serra, que nos abraça, numa vasta baía, desde a Fortaleza do Outão, até lá longe, onde a vista alcança, perto de outra Fortaleza, a de Santa Maria da Arrábida. A meia encosta da Serra, acima de Alpertuche, a paisagem é salpicada pelas capelas e guaritas do Convento Velho. Numa elevação anterior, adivinha-se o casario branco do Conventinho.


No caminho de areia que o mar esculpiu, foge-nos o pensamento para tempos muito antigos, quando a Serra foi morada do primeiro eremita, Frei Martinho de Santa Maria, que em 1539 rumou à Arrábida. E para Frei Agostinho da Cruz, o grande poeta-eremita, que em 1605 seguiu o mesmo caminho.


A Serra, hoje, mercê dos caprichos do tempo e da mão nem sempre benfazeja do Homem, já não é o lugar de recolhimento e silêncio de outrora. Mas, ainda assim, ainda nos vai mostrando, em dias como o de hoje, um resquício do seu mistério e esplendor.

Salvador Peres

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Os Cinco Sentidos - OLFACTO


O OLFA(C)TO

Ou

Por uma Ordenação Categórica dos Sentidos

 

“Não me cheira!” – afirmou o Tio Feliciano, quando lhe perguntei se estava a pensar adotar o Acordo Ortográfico de 1990.

Analfabeto desde muito jovem, o Tio Feliciano (o Tio, abreviadamente) não sabia – vejam só a coincidência! – ler nem escrever e, talvez por isso, negava relevância à questão com o mesmo ar ingénuo que envergava enquanto folheava um jornal.

O certo é que, à pala de não ganhar nada em olhar para as legendas de filmes ou parangonas de matutinos, vespertinos ou periódicos, o Tio ligava a televisão para ver o Preço Certo e a publicidade – apreciando particularmente a protagonizada pelo Toy. Na vida real era um curioso nato pelo que se passava à sua volta; gostava de uma boa intriga; empenhava-se em acaloradas discussões; e, obviamente, metia o nariz em tudo, inclusivamente e não raras vezes naquilo para que não era chamado.

Deixemos agora o Tio (que, diga-se em abono da verdade, consta que em miúdo não passava de um pivete encardido) no seu descanso – que esperamos, muito sinceramente, que seja eterno – e abordemos o tema por outro prisma, por um prisma que tresanda a polémico: o que tem o Olfa(c)to a mais ou a menos que os outros quatro sentidos (deixando nesta obra de parte o terreno escorregadio do debate sobre o famigerado sexto sentido)?

Por que razão o Olfa(c)to raramente aparece em primeiro lugar quando se enunciam os cinco sentidos oficialmente reconhecidos?

Não haverá uma necessidade de ordenar categórica e consequentemente, por grau de importância, os sentidos? – sendo que, dado que os últimos são os primeiros, evitaremos apenas para os lugares do meio (lá onde está a virtude com a sua duvidosa fragrância), queremos o primeiro ou o último!

{Ou ambos, porque tudo na vida tem dois sentidos [até os becos sem saída (que é onde agora me sinto a marchar neste texto.)]}

Sejamos lestos e concisos, que a conversa já fede:

- Existe a língua gestual para quem está privado da Audição!

- Inventaram o Braille para os que não têm Visão!

- Que extraordinários perigos correremos se, em alguns contextos, não cheirarmos antes de lançar mão ao Tacto?

- Quem se atreverá, se o odor for nauseabundo, a pôr em risco o seu Paladar?

Pesemos bem todos os dados e não nos será, nesta disputa, difícil sentir o aroma da vitória do Olfa(c)to (logo na primeira volta e sem necessidade de recurso a fétidas manobras de bastidores).

Porque o Olfa(c)to é um imperativo orgânico influente e incontornável! Ajuda todos os outros sentidos mais do que qualquer dos outros sentidos o ajudam!

É o Olfa(c)to, inclusive, que nos garante, em primeira mão, que já devíamos ter levado ao passeio de rotina aquele que é considerado o melhor amigo do Homem!

Sem o Olfa(c)to muitas circunstâncias malcheirosas poderiam sobrevir e transtornar a nossa frágil e efémera existência, deixando-nos à mercê dos outros quatro sentidos (e do que, então, passaria a quinto, livra…), desorientados, confusos, coitados!

Muito respeito pelo Olfa(c)to! Sejam quais forem a situação ou o sentido que nos pressionem para algo, há que, primeiro, cheirar para crer.


Nota: Texto publicado na Edição Especial de Aniversário do Magazine Synapsis


António Manuel dos Santos


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OS SENTIDOS DA VIDA

João Coelho



Pode o coração impedir-te de ver bem?




De ti duvido. Do azul do céu, não!

Nota: Fotos publicadas no Portefólio da Edição Especial de Aniversário do Magazine Synapsis


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Exposição "Retrospetiva 50 Anos MAEDS

MAEDS - Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal inaugura, a 18 de maio, pelas 16h00, a exposição “Retrospetiva 50 Anos MAEDS”.

A mostra celebra meio século de história, descobertas e dedicação à cultura da Região.

A exposição estará patente ao público até 11 de janeiro de 2025.

 

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Caminhada Synapsis

Do Cais Sul do Ferry até à Marina de Tróia

A próxima caminhada Synapsis realiza-se a 19 de Maio, com o seguinte programa:


08h15 - Concentração na bilheteira do Cais de embarque dos ferries, nas Fontaínhas, Setúbal
08h30 - Partida de Ferry para Tróia
09h00 - Início da caminhada
12h15 - Fim da caminhada na Marina de Tróia
12h30 - Regresso no Catamaran a Setúbal



O bilhete para o Ferry serve o regresso no Catamaran

A caminhada far-se-á desde o Cais Sul dos ferries até à Marina de Tróia, sempre pela zona dunar, circundando a Base dos Fuzileiros e a Caldeira.

Recomenda-se calçado e roupa adequados ao percurso, cobertura para a cabeça e protector solar.

A caminhada é gratuita, mas obriga a inscrição prévia até ao dia 17 de Maio para o endereço de email synapsis11@gmail.com.


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A Exposição 'A Espiritualidade da Arrábida' continua 

patente nos claustros da Igreja de S. Sebastião, em Setúbal




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Exposição 'Há Cidades que não têm nome', 

de Fátima Vicente Silva, é inaugurada

no dia 16 no Espaço Imperfeito, em Lisboa


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FICHA TÉCNICA

Coordenação Editorial de Salvador Peres e José Alex Gandum

 Textos de António Manuel dos Santos, José Alex Gandum e Salvador Peres

 Imagens de José Alex Gandum, João Coelho e Salvador Peres

 Edição de Salvador Peres


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