Tempo - Fernando Antunes
Tarde noite dia. Não sei. Cansei-me de ser nada. Perdi-me na dimensão do tempo. Os sentimentos têm uma abrangência difícil de gerir. Há-os ligeiros que, sendo bons, o tempo os leva rapidamente para uma qualquer gaveta de recordações. Se são incomodativos, o tempo se encarrega de os varrer de forma total e permanente do nosso dia a dia. Uma relação social ou profissional facilmente a memória arquiva se era boa e acabou; ou, pelo contrário, a extingue definitivamente, sem deixar rasto, se era incómoda ou simplesmente inócua. Quer tenham sido registadas ou expulsas, não deixam marcas, é possível continuar a movimentarmo-nos nas mesmas situações com uma ausência interior, estando não estando. Onde estávamos por inteiro, agora será apenas um lugar onde agimos sem sermos. Apenas um corpo, uma mente que trabalha, sorri ou debita frases circunstanciais. É como se desaparecêssemos e, no entanto, estamos ali. Ausentes na nossa presença. E voltamos a